O Fraco Rei faz Fraca a Forte Gente

Camões? Sim, Camões. Os clássicos dão sempre grande ajuda a enquadrar o mundo e são um auxílio decisivo para se perceberem as coisas. A quem se refere esta passagem do Canto III dos Lusíadas? A D. Fernando, “o brando, remisso e sem cuidado algum”.

O exercício do poder reflete o que as pessoas são. E reflete-se nas pessoas sobre as quais se exerce. Houve, na nossa História, monarcas e dirigentes como aqueles que Camões caracteriza. De reis fracos e hesitantes tivemos alguns exemplos na nossa História. D. Fernando sem dúvida que foi um deles. Poderíamos juntar-lhe D. Afonso VI, que acabou os seus dias destituído da coroa, num exílio interno forçado e à margem do mundo. Ou o bizarro e dúbio D. Sebastião. De sexualidade equívoca, perdido em delírios e alucinado com a grandeza imperial, atolou o País na tragédia de Alcácer Quibir.

Ser historiador levou-me, muitas vezes, a pensar sobre estas realidades. E a escrever uma par de vezes sobre elas. Ao longo dos anos, uma convicção se me foi firmando. Precisamos de palavras e de ação e não de conversa e de propaganda. Porque os que só falam e dizem que vão fazer e que “agora é que vai ser”, nunca daí passam. Não é, nem será, porque não sabem fazer nem para tal estão preparados.

O Marquês de Pombal mais que Frei Manuel Pereira, Fontes Pereira de Melo muito mais que João Franco, o Conde de Castelo Melhor muito mais decisivo que o Cardeal da Mota.

Santiago Macias

Nesse sentido, quem nos fez falta? O Marquês de Pombal mais que Frei Manuel Pereira, Fontes Pereira de Melo muito mais que João Franco, o Conde de Castelo Melhor muito mais decisivo que o Cardeal da Mota. De que precisamos? De ação, de empreendimentos e de iniciativas. De menos cortinas de fumo, de menos fuga à responsabilidade (a culpa é sempre “dos outros”…), de menos conversa fiada dos que estão contra Lisboa quando falam no Alentejo, e que estão pacatamente com Lisboa quando se tomam decisões importantes.

Lembro-me sempre, quando olho para fracos dirigentes, de um documento do século XVI, transcrito no texto “Auto d’uma posse do Castello de Noudar e inventário do que lá existia no século XVI”, publicado por Pedro de Azevedo. Em vez de apresentar soluções, o novo alcaide fazia um relato catastrófico do que o antecessor supostamente lhe legara. Quaisquer paralelos com a realidade atual não são coincidência. É um clássico da política do truquezito. Primeiro, fazem-se promessas irrealistas. Depois, já no Poder, age-se à Luís D’Antas, o tal alcaide de Noudar: afinal não pode ser, porque isto estava tudo espatifado. E precisamos de auditorias, porque é preciso sabermos tudo… E embrulha-se tudo na suspeita, que é sempre a melhor solução quando não se tem solução concreta para os problemas. E adia-se, uma vez e outra, entre festas e festarolas e promessas e mais promessas.

São assim os reis, os ministros, os autarcas que fazem pela vida. Que não resolvem, Que se perdem em desculpas e em propaganda. E que fazem fraca a forte gente.

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